Monday, May 08, 2006

Donizete Galvao




MUNDO MUDO é o mais recente livro de Donizete Galvão (São Paulo,2003), ilustrado com desenhos a tinta de Rogério Barbosa, que ganhou o prémio Gunther de Pintura em 1994.
O meu encontro com Donizete deu-se através do comum amor pela poesia de Paul Celan, mas sou hoje uma leitora fiel do que ele escreve e me vai mandando.
A sua obra poética é publicada desde 1988, sendo logo reconhecida e premiada com o Prémio APCA de autor revelação. Mas a obra define-se pela continuação e não apenas pelo arranque, ainda que já distinto e merecendo distinção.Li com especial prazer DO SILÊNCIO DA PEDRA (1996 ) e A CARNE E O TEMPO (1997 ), entre outros dos seus livros.
Neste MUNDO MUDO, a epígrafe é de Paul Celan :
" Mudo o que entrou
na vida, mudo."

Toda a poesia, como a vida, é feita de mudança. Camões também passa por aqui.Na primeira série, A NOITE DAS PALAVRAS, é patente uma amargura que o olhar simples das coisas simples, noutros poemas, não consegue apagar:

Lady Macbeth

"Que vê
quando me vê?
Um cão,
um ladrão,
um osso,
um fosso,
um traste,
um rapaz
de olhos tristes?

Que diz
a aspereza
das palavras
em ira?
Boa sorte,
boa morte,
fica na tua,
que a serventia da casa
é a porta da rua ? "


Lembrança de Severo Sarduy

" Quando se fere
com a tesoura
a haste
da manga,
escorre
o líquido,
visco
oloroso
que prenuncia
nas ventas
o gozo.
Antecipação
do paraíso
na tarde calorenta
do suco de manga
gelado
que desliza
pela garganta."


No ciclo dos HOMENS SEM MORADAS, caminhando já para o fim do livro, o Crepúsculo, que antecede o Mundo Mudo, o mundo em que de tanto falar (que não é o mesmo que dizer ) e tanto comunicar o que acontece é a noite da solidão e do silencio,surge a imagem da Besta do Apocalipse:

" Este é o espaço da Besta triunfante.
Uns trazem o peito marcado por seus cascos.
Outros, de fora, imploram para ser pisoteados."

Não é preciso que chegue o fim do mundo para que a Besta nos atormente.Esse tormento pode ser aquele a que todos os dias assistimos, sem poder fazer nada. DIZER é então importante, imperativo, para que o mundo não emudeça de vez à nossa volta.
As manchas da indiferença, como as de sangue nas mãos de Lady Macbeth , não serão apagadas.Como diz um dos críticos da obra de Donizete ,a sua poesia já não busca o "efeito". É simples e directa, o seu mundo é o da gente pequena, marcando as suas origens, é o dos mitos e rituais com que aprendeu a entender melhor o mundo que o rodeava, é o do dizer límpido que se situa entre o movimento e o repouso:
" Roçar de andorinha
entre vôo e pouso.
Parábola desenhada
por vento e asa."
(in Notícias do dia )

2 comments:

Sir G said...

Dear Yvette,

please forgive me that I cannot write in Portuguese, but I can read it, and I am very happy to have discovered your blog. I will give you a link and I will be back again to read more of your posts. (I read Portuguese very very slowly, so I must wait for a day when I have a free afternoon).

It is a pleasure to meet you!

Gawain

Yvette Centeno said...

Dear Gawain, keep reading, its a beautiful language with great poets; you can write to me in English, German or French, even Spanish, at ease.
Thanks for your interest,
Yvette