O pedido de um amigo Editor, José da Cruz Santos, fez-me voltar a Blake e à sua poesia, misteriosa e actual pelo desafio que lança à nossa imaginação.
Nesta obra Blake pretende mostrar, como diz, " the two contrary states of the human soul" - os dois estados contrários da alma humana, através das líricas da pureza inocente, canções de grande beleza rítmica, e no seu oposto as líricas misteriosas, intensas, quase perversas na inesperada inversão, do que apelida de canções de Experiência.
A Experiência é a percepção do Mal, no Universo criado, como se a mão de Deus fosse de repente desviada do seu verdadeiro primordial caminho.
A mais célebre das canções de Experiência é a do Tigre - e foi esta que o meu amigo me pediu para traduzir.
O Tigre como figuração do Mal: um mal absoluto, inexplicável, ardendo nos olhos de um animal de grande porte e nobreza. Saído da mão de um Deus não menos perigoso, cuja "outra face" é essa mesmo que o Tigre representa. Deus é um deus dividido, pois se dividiu na criação. E dele fazem parte o Bem e o Mal.
Blake, teósofo, visionário, pertencendo ao grupo de leitores de Boehme, sabe, sente, que a treva se esconde no coração da luz, e que na alma humana, como já Goethe dissera no Fausto, coexistem duas almas: a luminosa e a obscura.
Das traduções que conheço em língua portuguesa, a mais inspirada é sem dúvida a de Augusto de Campos, notável poeta e tradutor brasileiro. Pode ser encontrada pelo google.
Mas fiz a minha, para a edição do conjunto que Cruz Santos publicará na colecção "Oiro do Dia".
William Blake (1757-1827)
O Tigre
Tigre, tigre, fogo ardendo
na escuridão da floresta,
que olhar eterno ou que mão
tão temível simetria desenhou?
Em que céus ou profundezas
arde o fogo dos teus olhos?
E ele, que asas deseja ter?
Que mão ao fogo se atreve?
Qual o ombro, qual a arte,
que o teu coração torceu?
Ao começar a bater,
mão terrível, pés de horror,
que martelo e que corrente?
O teu cérebro, em que forno?
Que bigorna e que tormento
te prenderam ao temor?
Quando as estrelas suas lanças depuseram,
e o céu com as suas lágrimas molharam,
sorriu Ele perante a obra?
Ele, que fez o Cordeiro, também a ti concebeu?
Tigre, tigre, fogo ardendo
na escuridão da floresta
que olhar eterno ou que mão
tão temível simetria em ti ousou?
(versão livre, 2012)
William Blake (1757-1827)
O Tigre
Tigre, tigre, fogo ardendo
na escuridão da floresta,
que olhar eterno ou que mão
tão temível simetria desenhou?
Em que céus ou profundezas
arde o fogo dos teus olhos?
E ele, que asas deseja ter?
Que mão ao fogo se atreve?
Qual o ombro, qual a arte,
que o teu coração torceu?
Ao começar a bater,
mão terrível, pés de horror,
que martelo e que corrente?
O teu cérebro, em que forno?
Que bigorna e que tormento
te prenderam ao temor?
Quando as estrelas suas lanças depuseram,
e o céu com as suas lágrimas molharam,
sorriu Ele perante a obra?
Ele, que fez o Cordeiro, também a ti concebeu?
Tigre, tigre, fogo ardendo
na escuridão da floresta
que olhar eterno ou que mão
tão temível simetria em ti ousou?
(versão livre, 2012)
3 comments:
Sou uma apaixonada por William Blake. Tenho pena que em Portugal não haja uma boa tradução para o grande público.
Tenho acesso à obra em inglês, por vezes nem sempre fácil de entender.
Boa tarde!
Cara Amiga
Não haverá em língua brasileira uma tradução completa da obra? Vamos procurar...Em Portugal eu veria um Vasco Graça Moura a fazer belíssimas traduções.Mas tinha de haver editor, claro!
Rilke
la pantera no esta ciega
esta encerrada mirando los barrotes
da vueltas por la jaula y te mira con ojos dulces
se mueve muy rapido y levanta la patita
por que esta domesticada
que le pasa por la cabeza
pues salir de la jaula
y hacer una amiguita pantera
Post a Comment