Thursday, April 22, 2010

Brilho no Escuro


Outras ocupações me deixaram um pouco afastada do blog, mas não há coincidências e aqui regresso pela mão amiga de quem ama a literatura e arte e me envia outros números da revista Brilho no Escuro:agradeço a Isabel de Sá, a Graça Martins e ao João Borges, que me anuncia a preparação de um n.4.
Estejam atentos.
Podemos agora ver melhor como de um onirismo sarcástico, fazendo evocar alguns dos poemas e das collagens de Jacques Prévert bem como as leituras apaixonadas da obra de Comte Lautréamont - a grande Bíblia do surrealismo em França e entre nós - as criadoras partiram para a expressão mais intensa, quem sabe se mais dolorosa, dos atamentos da alma de que as cordas e os nós são a marca visível e quantas vezes sangrenta.
Tantos e tantos anos passados, e as almas sangram na mesma. Podemos dizer, como Verlaine "em diálogo" com Rimbaud:
Chora-se no meu coração
como chove na cidade
Verlaine chorava o amor perdido de Rimbaud, nós choramos hoje a esperança traída, o horizonte fechado, e só na arte temos refúgio, nos criadores que continuam presentes: o seu dizer torna-se o único dizer possível, na pintura, no poema, na ilustração, neste caso concreto destas revistas de fulgurante brilho..
Por um lado são eles que nos apontam novamente o caminho, como fizeram outrora (nos anos sessenta, os anos da "verde" esperança dos Verdes Anos) .
João Borges, partindo de uma título de Agustina Bessa Luís, oferece um ciclo de poemas:
Canção Diante De Uma Porta Fechada
...
Diante de uma porta fechada, estou sentado e canto. Para a chuva, para o que está do outro lado.
...

Este verso é uma entrada em diálogo com o espaço de um quarto, de uma cidade onde também chove, como na de Verlaine, uma entrada em diálogo com a leitura íntima de uma autora, uma obra (foi de início Agustina) é de seguida Irene Lisboa, a minuciosa, a ciosa da sua escrita, a tão esquecida apesar de tão inscrita no mundo. Um mundo fechado.
Interessante é ver como os poetas, através das suas obras, falam uns com os outros, como no tempo o diálogo pode não ter interrupção, é uma questão de acaso e de momento.
Mas:
O livro tem de estar ali, tem de estar disponível, como a pintura tem de ter direito à sua legítima parede, a ilustração à folha que já chama por ela, clama desesperadamente por ela, para ser um tempo que se torna espaço, como em Parzival acontece ao reino do Graal, um tempo mágico que se torna actual, presente, só ali, para cada um e para todos, para sempre.
Não me esqueçam, pinta Graça Martins na imagem que escolhi para o post, e eu digo com ela, não a esqueçam, nem a ela nem a nenhum destes nossos compagnons de route!