Friday, April 27, 2007

Manuel Alegre



Chega Manuel, com as Doze Naus :
....
"Entre aquém e além ser e não ser
tantas portas abertas ou talvez nenhuma.
Não há senão um verso por escrever
e sobre a areia branca a breve espuma."

Sente-se em alguns dos poemas uma inquietação melancólica, uma interrogação perplexa, uma quase lamentação interpelando um deus que continua escondido, uma voz que ainda não se fez ouvir, um verso que ainda não foi escrito: "Agora tenho de escrever o poema/ porque nada está escrito.E o que se acaba não acaba"...
É assim mesmo o tempo do poeta, cruza os mares da vida numa viagem sem fim.

Sunday, April 22, 2007



O MONTE

anoitecer suave
no topo das colinas

calam-se os pássaros,
as lebres e os coelhos
aninham-se nas tocas

sai um morcego
a mordiscar romãs

os gatos sorrateiros
saltam entre os telhados
em busca de algum ninho
ou de algum rato

luar de Agosto

lá em baixo
na estrada
conversam os namorados

Chanson pour mes petits-enfants




LE JOUR ET LA NUIT

Pendant le jour l'enfant s'amuse.
Il aime regarder autour de lui:
la maison
le soleil
l'arbre dans le jardin
l'oiseau qui vole dans le ciel
la voiture
l'avion
l'autobus ramenant les enfants de l'école
un petit garçon qui promène son chien
un autre qui s'en va jouer un peu plus loin...

La nuit descend, l'enfant s'endort
ses rêves sont heureux.
Parfois un monstre arrive qui fait peur
l'enfant crie au secours
le monstre disparaît
tout est bien dans sa chambre:
les jouets lui font signe
ils sont gais,ils sont là.
N'aie pas peur
dit le petit poussin
il est beau, il est doux
jaune comme un soleil.

Le soleil chasse l'ombre
l'enfant s'endort tranquille
bientôt le jour viendra.

Tuesday, April 17, 2007

A FERVURA DO AIRE



Um encontro de saudade com Antonio Dominguez Rey, poeta, professor, ensaista, no MAPA DA LINGUA PORTUGUESA NO MUNDO: "siga a trilha de quem fala português"...
Reli o seu estudo sobre Antonio Machado, encontrando na saudade que o poeta teve de Platão e de Cristo uma nova fórmula para um moderno Graal:

"Dices que nada se créa?
No te importe, con el barro
de la tierra haz una copa
para que beba tu hermano".

Mas de uma ideia parti para outra, a da poesia de Antonio Rey, ele mesmo poeta do encantamento da palavra.
E tão belo é o seu soar que não traduzo, apesar da língua-gémea facilitar a tradução, deixo no original um fragmento do poema que encontrei.Há navegações felizes...

A FERVURA DO AIRE

Subín ó monte cheo
de ruídos e espantallos
que arredaban as aves
sen poderen picar
os grans da miña sombra.
Adentreime entre os piños
e sentín lenta a luz
no corpo, xa baleiro
da teima que porfía.
Ergueito, nu, cos brazos
oferentes, as febras
do sol nos lises tenros,
cantei vellas gabanzas
à humidade das fontes,
ó arrecendo da terra,
ó rulo dos paxaros
no segredo da fraga.
Vivín, lonxano, o arrolo
do mar nas ponlas luídas
e fun herba silvestre
ou mastro na marea
sobranceira das árbores.
....
Voa, paxaro, ó fondo
pecho do ceo, voa.
A miña inquedanza abre
de anseios a gaiola.
Voa, corazón, voa
ó mais lonxe da vida,
que non me cabes dentro,
e douna por perdida.
....
O alento esvae sempre
un paxaro de lume
invisíbel e acende
a fervura bendada
da arxila no poema.
....
Hora na que a palabra,
sen ser, lucente abrolla
a vertixe do instante.
Inquedanza da sombra,
premura devanceira
que rexorde o tecido
do ceo con agoiros
e xemidos de cobre.
....
Morreron as palabras,
as frases, a sintaxe
do mundo.O que non morre
é a fervura do aire,
as raíces dos talos
que ruben polas gorxas
agoirando palabras.


Eis o canto, incompleto, com o desejo que deixa de continuar a ser.

Thursday, April 12, 2007

DALI



Um lema para todos os criadores:
"Desde pequeno o meu lema é o de Montaigne: não se consegue o universal senão a partir do ultra local" (Salvador Dali ).
Assim, em Figueras, se ia formando um génio cuja obra teve e tem reconhecimento indiscutível.
Pergunto, quem tem medo de ler Montaigne, hoje em dia, quem reflecte sobe a sua escrita sóbria, nítida, exemplar ? Do alto da sua Torre nenhum detalhe, nenhuma observação, lhe escapa.
Mas vinha isto a propósito de mais um achado meu nas caixas do CAVE CANIS: a reprodução da primeira novela de Salvador Dali, incompleta, e que o grupo transcreveu para a tornar acessível. Datada de 1920, já revela a imaginação prodigiosa que será sua marca, a par do gosto do local, neste caso uma pequena povoação perto de Figueras, onde situa o enredo. Mostro, para que conste, sem mais. O título é Tardes d'estiu, e a edição foi feita ao cuidado de Victor Fernandez. Escrito em catalão, seria interessante traduzir este texto, ainda que se trate de um fragmento.

Monday, April 09, 2007

A ARCA DE PESSOA



Amigos leitores de Fernando Pessoa, uma boa notícia:
Saiu já, em edição do ICS, com organização de Steffen Dix e Jerónimo Pizarro, o conjunto de comunicações apresentadas no Colóquio de Leipzig que ambos organizaram em 2005.
Parabéns aos organizadores e ao ICS que permite aos investigadores fazer obra continuada.
Agora é ler, a Arca está aberta, venham os novos Indiana Jones...

Tuesday, April 03, 2007

Palau i Fabre


Grande amigo de Picasso, Josep Palau i Fabre viveu em França na década de 40.
Colaborou em 1996, a convite da Fundação Gulbenkian, num ciclo intitulado CLARÓS INSTANT, Imagem e Palavra na Poesia Catalã Actual.
Devo dizer que talvez dessa ideia de Imagem e Palavra me tenha surgido a mim a ideia do nome deste blog.
Tinha tido a honra de conhecer Palau i Fabre muitos anos antes, em Barcelona, ficando aí a saber que ele era, não apenas um amigo, mas um dos maiores conhecedores da obra de Picasso.
Além de poesia, que deixarei documentada com um pequeno exemplo, interessava-se, como eu, pela simbólica alquímica.
Nas edições 62, Historia de la Literatura Catalana, podemos ler POEMAS DE L'ALQUIMISTA, publicados em conjunto com outro grande artista JOAN BROSSA.
Aqui fica a versão livre de um dos seus poemas, lido outrora, em 1996:

PEDRA ( a Xavier Zubiri)

Dura como a água dura.
Raiz de si própria.
Em êxtase perpétuo
a pedra perpetua
a pedra, imagem pura
e a ideia de pedra
se nos torna madura
(1942)

De um artista bem mais jovem, Perejaume, nascido em 1957, um poema que também foi lido entre nós e de que deixo a versão livre:

VOLTEM A PÔR

Voltem a pôr na terra o ouro, espalhem na montanha o bronze, o mármore e o marfim, para que representem aquilo que agora mais falta nos faz: o lugar de onde sairam..

Jan Fabre


Da caixa do Cave Canis, outra surpresa, Jan Fabre:
" M'agrada el moviment, els colors que es confonen entre ells,
la flama que es revifa, la brillantor i el centelleig de la llum,
la mort d'un tros de fusta, les brases, la foscor
i el nou començament..."

Aos Amigos do Cave Canis


Arrumando prateleiras, o reencontro feliz com os artistas de CAVE CANIS. Eram (são? ) muitos e animados de um espirito de liberdade e criatividade que neste momento ainda mais falta me fazem.
Cito, do Manifesto contra o Populismo Perverso:

" Sense ètica, no hi ha estètica.Ni dignitat.
...
L'art no és un entreteniment vagarós, lleure de privileiats que es miren el món des de fora, com a espectadors.Parafresejant Picasso/Tàpies:l'art es una arma de guerra contra l'enemic, un mitja per combatre l'obscurantisme i la violència.
...
En temps de barbàrie, vindiquem la il-lustració contra les tenebres,l'esperit critic contra el dogma...Això es: la dignitat contra la immundícia."

A ilustração é um negativo de MANEL ESCLUSA: La pedra, La Muntanya, L'Univers...
da exposição de Boston, 1983