Todo o título, seja de um poema seja de uma pintura é uma indicação de possível leitura, que assim é dada a quem contempla ou quem lê. Pode não ser indicação, pode ser armadilha em que se cai. De todo o modo alguma coisa acontece que apenas assim se descobre.
Tenho na mão o catálogo do mais recente ciclo de pinturas de Pedro Chorão, exposto na Sá da Costa, que pela referência que deixa - diálogos sensíveis - nos faz pensar: não eram sensíveis os quadros anteriores, explosões de azuis entre o mar e o céu, na Galeria Monumental?
O pintor, na anterior como nesta mais actual produção, que renova as linguagens, diz o que sente, e vem dito nas respostas da entrevista que podemos ler no interior do catálogo: não há arte onde não haja sensibilidade, genuína. O sensível, mesmo quando não explicitamente referido, é a matéria mesma da obra.
As cores escolhidas em cada pincelada também têm o seu segredo guardado. Aqui a pincelada é espessa, é forte, pede que nos demoremos no contorno escolhido para cada côr.
Não há repetição, há olhar paciente, que renova, e confere a cada quadro uma nova originalidade que contudo não dilui a grande coerência que é marca de Pedro Chorão. Podemos transitar de um ciclo para outro, dos princípios das Paisagens ou das Ventanias, até chegar a estes diálogos Sensíveis e logo reconhecemos a sua mão, que encerra em cada caso uma nova noção do que se está a fazer, oferecendo ao outro, a quem contempla, pensamento que ali se abre, e com ele mais conhecimento e acima de tudo emoção.
Assim como um poeta tenta explicar, a quem lhe pergunta, o que é um poema, tomo a liberdade de citar um amigo, Sérgio Ninguém:
Tentar perceber um poema
é como olhar para um deserto sem bússola.
Um poema é uma pedra duríssima
que ninguém explica (atrofia perene, p.25)
não se pergunte a um pintor o que é uma pintura. Ou como pinta, que ele olhará com espanto aquele que não fez o esforço de primeiro procurar entender, mesmo que não entenda nunca, pois nenhuma explicação ajudará.
Neste caso, de Pedro Chorão, cada pintura é uma procura nova, de algo indizível, nascido do silêncio da alma e que só depois da última pincelada (seria do último verso) se poderá (ou não) explicar. Ele precisa, tal como o outro que o interroga, da mesma interrogação, seja deserto ou pedra, mas em que descubra a matéria sensível que se deixe moldar, como ele devagarinho ou com fúria mal contida irá fazer. Nisso consiste o trabalho de um criador: moldar, em diálogo sensível, a sua matéria que é vida e vida revivida, quantas vezes, sempre que o momento exige.
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