Mas não podia ser mais actual a sua leitura nos dias conturbados que correm.
O tempo de que ele se ocupa, da Revolução de Abril vivida por jovens entre o Liceu e a Universidade, nascidos e criados em famílias burguesas uns e famílias politicamente mais evoluidas e activas outros, entre eles o jovem herói, faz reflectir sobre o tempo que vivem agora os jovens do século XXI, num Portugal que não assimilou por completo as lições da tão aguardada Democracia .
A verdadeira história de vida que se desenha na obra, e lhe confere um interesse acrescido de memória social, justificaria plenamente a recomendação de leitura.
Mas há mais: a narrativa distingue-se por uma qualidade que lhe é muito própria, correndo a um ritmo tão veloz quanto o das aventuras e das surpresas vividas, numa linguagem simples e directa, não descartando o coloquial, distanciando-se quanto baste com sentido de humor, o que faz do nosso exercício de acompanhamento uma aventura prazenteira.
O autor é um erudito (da área dos estudos anglo-americanos) que não exibe a sua erudição, mas nos deixa em subtexto a experiência e a grande cultura transversal que possui:
dos romances de um Sterne, por exemplo, de um Melville, de um Joyce que fez o seu retrato quando jovem, de um Faulkner cujo realismo foi chegando à modernidade portuguesa, de uma Virginia Woolf (autores que M.Avelar traduziu) - e fico por aqui, pois muitos mais poderia citar. Nós somos o que lemos, disse alguém. E um escritor é feito das suas muitas leituras.
Há uma outra dimensão, crítica e humorística que também distingue esta obra, sem que se perca no entanto o verdadeiro sentido do que nela se deseja preservar:
a memória de uma Revolução que atravessou uma sociedade envelhecida e à qual os jovens da época ( entre a surpresa, o entusiasmo ou as lágrimas, a militância, a distância ou a descrença) emprestaram as suas vidas, entregaram o seu futuro.
Nem que fosse apenas por esta razão, nós, os leitores mais velhos, que vivemos com outra idade aqueles tempos e nos reconhecemos nos episódios descritos, devemos recomendar uma nova edição, para novas leituras dos novos adolescentes e não só.