Wednesday, August 16, 2017

Rimbaud, o mar e o sol, a Eternidade

Falarei do que é pequeno, simples, e ainda assim inspirado. Como o Rimbaud em êxtase alquímico, de fusão plena, nos versos da Eternidade. Quem gostará, como eu, de os dizer tão repetidamente?
O que é a Eternidade?
É o mar
Dissolvido no sol

 C’est quoi l’éternité?
 C’est la mer
Mêlée au soleil

Das três versões conhecidas,  a última é a que prefiro, já direi porquê, pela alteração do último verso:
Version 3
Manuscrit inconnu.
Reproduit d'après l'édition originale de la 
Saison en Enfer (1873).
Elle est retrouvée !
Quoi ? l'éternité.
C'est la mer mêlée
     Au soleil.

Mon âme éternelle,
Observe ton vœu
Malgré la nuit seule
Et le jour en feu.

Donc tu te dégages
Des humains suffrages,
Des communs élans !
Tu voles selon...

— Jamais l'espérance.
     Pas d'orietur.
Science et patience,
Le supplice est sûr.

Plus de lendemain,
Braises de satin,
     Votre ardeur
     Est le devoir.

Elle est retrouvée !
— Quoi ? — l'Éternité.
C'est la mer mêlée
     Au soleil.
Não é a mesma coisa o mar fugido com o sol (como nas  duas anteriores versões conhecidas) como se o mar (feminino, na língua francesa, como a água) ao fugir com o sol, masculino em ambas as línguas, no original e na tradução portuguesa que gostei de fazer, permitisse imaginar o arquétipo do rapto de feminino por uma energia masculina, solar, mais forte e dominadora, como um Zeus dos antigos agora revivido pelo imaginário  do poeta.
Mas Rimbaud é um inquieto, e nesta descida que nos oferece às trevas mais profundas, da revolta de uma vida que ora nega ora renega, descobre, em iluminação (outro título para outra emoção sedutora) a via alquímica, que soube também, transformar em vivência poética. E a via alquímica não é de fuga, não é de rapto por um elemento mais forte e poderoso, é a via de uma fusão de Pares de Opostos, ambos poderosos, porque ambos transformadores (redentores), numa Conjunção perfeita.
O último verso é o que permite a verdadeira revelação, a verdadeira Iluminação, tão procurada, por tantos desvios e caminhos: mar e sol, ou água (lua) e sol dissolvidos um no outro. Assim os revemos nos mais antigos tratados, assim se redescobre o poeta no mais fundo de si mesmo, alquimista do Verbo, o Verbo que é o sopro original de que tudo provém, pela palavra proferida, ordenando o caos: do universo grande e do pequeno, do turbilhão da alma.
Quando escreve:

 Ô saisons, ô chateaux!
 Quelle âme est sans défauts?

J’ai fait la magique étude
Du bonheur, qu’aucun n’élude.
....
E anota no fim do poema que tudo aquilo se passou e pode então concluir: “ Je sais aujourd’hui saluer la beauté”. Pois sem ter vivido o mal não se descobre o bem, sem o feio dos defeitos da vida, assumidos, entendidos no seu sentido profundo (integrados, diria um junguiano) não se descortinará nunca o belo, a tal Beleza que reina, sentada à direita do Pai, como a Shekina generosa e abundante da mística da Kabala.

Tempos

pequeno pensamento:
tento, procuro, não encontro
não é o espaço,
é o tempo