Thursday, May 04, 2006

Guillevic


Em 1965 o poeta Guillevic veio a Lisboa, a convite de David Mourão-Ferreira.
Bretão, comunista militante e exigente, o seu verbo era a própria força da natureza em movimento, como as vagas daquele mar da Bretanha que ele tanto amava.
Mar e terra, matéria e espírito, o da força das ideias condutoras, que o levavam a escrever:

"Les mots
C'est pour savoir"

ou ainda:

" Les mots, les mots
Ne se laissent pas faire."

Sente-se, na poesia de Guillevic, o esforço e o respeito, que não permitem subterfúgios ligeiros, enganadores, e muito menos modismos como os que foram muitas vezes praticados pelos seus contemporâneos.Há no seu verbo uma entrega despojada e absoluta,uma força ao mesmo tempo comovida e implacável, perante as realidades da vida.
Teve uma infância dura, como bretão que partilhava ,com a simplicidade do olhar, a miséria que descreve por vezes em CARNAC. Mas é também neste ciclo que encontramos o "casamento da terra e do céu" tal como não existe em nenhum outro lugar:
" Nulle part comme à Carnac
Le ciel n'est à la terre,
Ne fait monde avec elle...

Para lá de qualquer enquadramento político, nunca negado, ou estético, o que fica é a "integração orgânica" como escreve um dos seus críticos,pois toda a sua poesia parte e é feita do "vivido". Ao recordá-lo como bretão vemo-lo rodeado de rochedos antigos, vagas alterosas, cozinhas com lareiras onde arde um fogo acolhedor.Os seus poemas são, no verdadeiro sentido "evocações" da sua condição, da condição humana quando a sua experiencia pouco a pouco se alarga.
Há um lado religioso, místico, panteísta, se se quiser, no Guillevic materialista.É homem nascido na pátria dos druidas, onde os rochedos marcam espaços sacrificiais, um "sangue místico" no dizer dos seus críticos, atravessa o seu vocabulário poético.
Nasceu em Carnac em 1907.O seu pai era marinheiro, a aventura corria-lhe no sangue.
Guillevic lê Marx, e em 1943 junta-se ao partido comunista clandestino. Já em 1942 se tornara amigo de Éluard,cujos poemas também bebiam nas mesmas convicções.

Deixo o leitor com alguns dos textos que a meu ver representam a marca forte do seu olhar, como em TERRAQUÉ:

Choses

L'armoire était de chêne
Et n'était pas ouverte.

Peut-être il en serait tombé des morts,
Peut-être il en serait tombé du pain.

Beaucoup de morts
Beaucoup de pain.

( 1942)

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