Thursday, October 04, 2007

O Budismo na Cultura Portuguesa



Com organização de PAULO BORGES e DUARTE BRAGA publicou-se na Ésquilo editores um volume dedicado ao Budismo na cultura portuguesa.
Colaboraram vários especialistas de renome e entre eles alguns cuja escolha recaiu sobre a obra de Pessoa/Caeiro : é o caso de José Eduardo dos Reis, com o ensaio POR QUE VEIO O ALBERTO CAEIRO DO OCIDENTE? Igualmente interessante se revela Catarina Nunes de Almeida, com o estudo da obra de Casimiro de Brito, escritor de grande sensibilidade, cujo interesse pela contemplação de índole Zen é conhecida, revelando-se sobretudo na sua poesia.
Esteve recentemente entre nós o Dalai Lama, Nobel da Paz, figura insigne da luta pela liberdade e pelos direitos humanos,que incluem, naturalmente, o direito de expressão religiosa: e aqui cumpre felicitar as edições Ésquilo, que publicaram O LIVRO TIBETANO DOS MORTOS com prefácio do Dalai Lama, e ainda SABEDORIA PARA VIVER, DALAI LAMA EM PORTUGAL (os textos da suas conferencias).
Embora julgue que todas as matérias, estas e outras que constam do catálogo, sejam trabalhadas a partir do inglês, é um sinal muito positivo que editores e estudiosos se empenhem em divulgar matérias relativas ao conhecimento e ampliação da nossa consciência espiritual, num momento em que, sobretudo na Europa, se volta a ser atacado pela doença do racionalismo positivista -sempre unificador e nunca inspirador (pois o interessante para o progresso maior é a diferença e não o culto doentio de uma "igualdade" que reduz, em vez de ajudar ao verdadeiro desenvolvimento, intelectual, artístico, religioso, e até social, económico, político; pois não se fala tanto e cada vez mais da necessidade de "oposições" bem preparadas?)
Os ensaios do volume trazem abundantes referências bibliográficas, o que é excelente para quem deseje aprofundar o estudo do Budismo em Portugal.
Uma observação ainda, a propósito do ensaio de Markus Gabriel : o conceito de UNGRUND não foi cunhado por Schelling mas por Jacob BOEHME, o grande teósofo alemão ( 1575-1624) inspirador de muitos autores subsequentes, como Goethe e Novalis, além do próprio Schelling. Sugiro como fonte, além do próprio BOEHME, as obras de Alexandre KOYRÉ, LA PHILOSOPHIE DE JACOB BOEHME, Vrin, Paris 1971, p.321; ou de mais fácil leitura, Jacob Boehme, Cahiers de l'Hermétisme, Albin Michel, Paris,1977, p.189 .
O Ungrund, (Sem-fundo) é um eterno Nada, como Boehme o define no Mysterium Pansophicum, um Vazio onde se gera a Palavra de onde surgirá a criação.Sem-fundo é o nome que poder ser dado a Deus: este é o " Nada eterno", o "Nada eterno que é o Uno eterno", "o Absoluto sem essência que em si mesmo é fundamento eterno", mas o nome que mais lhe convém, diz Boehme, é "Sem-fundo", abismo sem fundo e sem fundamento.E, como observa Koyré, o Ungrund não é a causa última nem primeira do mundo, e nem sequer a sua própria causa, é o Absoluto, sem mais : " É o fundo eternamente fecundo da vida e do Absoluto, o germe absoluto que, enquanto germe, não é ainda, e não é ainda nada, mas que contém dentro de si tudo o que irá ser".

Deixo uma sugestão: que se acrescente ao catálogo da Ésquilo uma tradução do I CHING, com os prefácios de Wilhelm, de Jung, e por que não, de novo o Dalai Lama.
Ou que se reimprima a obra notabilíssima do Padre Joaquim A. de Jesus Guerra : O LIVRO DAS MUTAÇÕES (publicado com o Prof. DR. Aidan Nai-kwong Poon).

2 comments:

Sérgio A. Correia said...

Há tempos, durante o lançamento de um livro, dei por mim a folhear distraidamente uma obra sobre arte viking. A páginas tantas, deparo-me, estarrecido, com a imagem de uma escultura viking de Buda. Num dos seus ensaios, diz Borges que o Oriente foi, até hoje, a maior descoberta que fez o Ocidente. E um dos exemplos que dá é o das trocas comerciais entre Roma e a índia. Por isso, vou lançar uma hipótese do fundo da minha ignorância: talvez tenha chegado a altura de se escrever a "História das sucessivas descobertas do Oriente", à semelhança do que se está a fazer actualmente, de uma forma que me parece séria, com a "descoberta da América pelos chineses"...(afinal de contas, estamos numa época de tão estranhas descobertas arqueológicas que não me espanta nada que esta "desocultação" da História nos tragas surpresas e, quem sabe, novos paradigmas...)

José Hedera said...

Caro Sérgio:
De fato, não só a História, mas também a Pré-História vêm sendo reescritas como nunca dantes. Já Camões sabia que as coisas todas são mudaves... Imagino a infinidade de memória que se perdeu irremediavelmente ao longo dos tempos, e que se resgatada pudesse ser, quais não seriam as nossas surpresas!